Recicleiros promove Live para debater como Créditos de Massa Futura podem impulsionar a reciclagem

O Instituto Recicleiros promoveu na última quarta-feira (28), a Live “Créditos de Massa Futura para Logística Reversa: papel estratégico para avanço da reciclagem inclusiva e mecanismos para realização de projetos”.

O evento online contou com a participação de representantes das esferas federal, estadual e municipal, como Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, CETESB e IMASUL, prefeituras, além de nomes ligados às organizações de catadores.

O objetivo era debater como o mecanismo de Massa Futura, que surgiu no Instituto Recicleiros alguns anos atrás e, mais recentemente, tornou-se parte do Decreto 11.413/2023, está abrindo novas possibilidades em termos de infraestrutura para o avanço da reciclagem inclusiva no Brasil.

Panorama geral

A Live começou com Erich Burger e Rafael Henrique, fundadores e atuais diretores do Instituto Recicleiros, falando sobre a situação atual e precária da reciclagem no Brasil. Na pauta, a demanda por infraestrutura para a recuperação de materiais pós-consumo e o papel estratégico do mecanismo de Massa Futura para adicionalidade dos resultados de reciclagem.

O Brasil gera mais de 82 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos todos os anos, de acordo com a Abrelpe. Nesse contexto, 60% das cidades brasileiras usam lixões e apenas 4% acaba sendo reciclado. “Evoluímos pouco nesses dois indicadores da gestão de resíduos em nosso país, que é o uso de lixões e baixas taxas de reciclagem. Desde o início de Recicleiros, há 17 anos, não vemos esses números evoluírem”, comentou Erich Burger.

Hoje, temos um grande volume de recicláveis que não contam com sistema de coleta seletiva, e encontram sobrevida pelas mãos dos catadores. São cerca de 1 milhão de catadoras e catadores, muitos sobrevivem com menos de um salário por mês. Do outro lado, temos uma procura crescente e cada vez mais consolidada pela reciclagem desses materiais, seja porque as empresas têm de cumprir o que diz a legislação nacional, a Política Nacional de Resíduos Sólidos, seja por terem aderido a agendas ESG, a pactos globais e precisam entregar reciclagem. 

“Existe um ponto de convergência muito íntimo entre o setor empresarial, prefeituras, catadores e cidadãos. A reciclagem precisa acontecer, mas não vem acontecendo, mesmo depois de 13 anos de Política Nacional de Resíduos Sólidos. Para ter resultados, precisamos sair de uma lógica de improviso e lançar uma solução transversal, interdependente e complexa. É preciso haver políticas públicas, capacidade de reciclar, mudar o comportamento do consumidor e amadurecer a relação com o mercado, fazer a reintrodução desses materiais acontecer de maneira estruturada e virtuosa”, acrescentou Erich.

Estamos falando de um problema que é comum a todos. E, de fato, a responsabilidade para resolver essa questão é compartilhada, como preconiza a nossa lei. O maior gargalo hoje, de acordo com Rafael Henrique, é o primeiro elo de recuperação do material reciclável, que sai da casa das pessoas.

“A Massa Futura é um elemento particular de viabilização de um projeto com características muito peculiares que, sim, por natureza é estruturante. Mas, se propõe a ir um pouco além. É gerador de adicionalidade em sua essência, traz impacto social e ambiental a partir da sedimentação de políticas públicas”, disse Rafael. 

A visão do Ministério do Meio Ambiente

Depois, foi a vez de Sabrina Gimenes, Coordenadora dos Processos de Logística Reversa e Resíduos Perigosos pelo Governo Federal, trazer a visão do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima sobre o tema. Sabrina abordou os resultados esperados com a regulamentação dos Créditos de Massa Futura, as condições previstas em lei para Massa Futura, além de critérios para validação de projeto e estudo de viabilidade econômica.

Sabrina afirmou que não tem como avançar na logística reversa se a coleta seletiva também não funcionar. 

“Quando fizemos a revisão do antigo Decreto, o Recicla+ para o 11.413, o nosso foco era como melhorar a participação dos catadores e a qualidade dos resíduos. Então, reforçamos a importância da continuidade dos projetos estruturantes. Porque hoje, no Brasil, a coleta seletiva ainda é precária e temos esse desafio enorme de como integrar a coleta seletiva com a logística reversa. E vimos os Créditos de Massa Futura como uma alternativa, uma solução integrada, que dá segurança jurídica para investimentos do setor empresarial, que tem a responsabilidade da logística reversa e que apoie também os municípios na estruturação da sua coleta seletiva. Esperamos com o Decreto a continuidade dos projetos”, falou Sabrina. 

Erich e Rafael retomaram a fala e mostraram, a partir do Programa Recicleiros Cidades, que está ativo em 14 cidades brasileiras atualmente, como Recicleiros tem trabalhado, na prática, com o mecanismo de Massa Futura. A dupla detalhou a experiência precursora do Programa do Instituto Recicleiros, revelou os resultados alcançados e compartilhou as lições aprendidas e principais desafios.

A participação dos Estados nesse processo

Em seguida, a discussão foi em torno do papel do Estado na validação, monitoramento e avaliação de medidas compensatórias. Regiane Yogui, que atua no Departamento de Políticas Públicas de Resíduos Sólidos e Eficiência dos Recursos da CETESB, e Luciene de Souza e Nathalia do Amaral, que fazem parte do corpo técnico da IMASUL, abordaram os principais aspectos dos Termos de Compromisso.

As falas incluíram também a validação dos projetos submetidos e monitoramento dos resultados, e a avaliação de medidas compensatórias em caso de não cumprimento da massa no período pré-estabelecido.

Tanto São Paulo quanto Mato Grosso do Sul, de maneira pioneira, regulamentaram a logística reversa em seus territórios.

“Uma coisa que foi bem importante para nós no Estado de São Paulo, foi a publicação da decisão de diretoria, lá em 2018, que trouxe a logística reversa como condicionante para a emissão das licenças. Isso trouxe um incentivo, um estímulo para que o setor produtivo passasse a aderir e investir nesses sistemas de logística reversa. A partir daí, começamos a conversar para entender como era realmente o sistema. Foi bem interessante porque passamos a entender que a necessidade de estruturação de Massa Futura era uma estratégia importante de ser agregada junto com os outros sistemas de logística reversa para que as empresas pudessem trazer os investimentos com segurança jurídica. Foram muitas reuniões em 2019, e o Termo de Compromisso só foi celebrado em 2020”, relembrou Regiane. 

Ela continuou: “precisamos dar os meios e as condições para que as empresas cumpram a logística reversa no Estado. A capacidade de coleta não está plenamente instalada para que todos os empreendimentos, se forem cobrados, cumpram a logística reversa. Então, precisamos diversificar as estratégias e a Massa Futura é uma possibilidade para essa ampliação, para que todos consigam trazer resultados e benefícios para o meio ambiente, saúde pública, geração de oportunidades, renda e emprego”.

As representantes do IMASUL também elogiaram o modelo proposto por Recicleiros.

“Vemos com bons olhos o modelo estruturante proposto por Recicleiros. Em Naviraí (MS), existe uma realidade antes e depois de Recicleiros. Vimos de perto o dimensionamento que foi feito em serviços de coleta seletiva, os roteiros dentro da cidade, a operação e toda a estratégia de comunicação e mobilização junto à comunidade. Isso foi muito importante, além da organização da cooperativa. Esse modelo beneficia não só os catadores, mas o município como um todo por conta da geração de renda, e essas pessoas precisam desse apoio do início ao fim”, relatou Nathália.

A vez dos gestores municipais

Dando continuidade, Marcio Zanetti, Prefeito de São José do Rio Pardo (SP), e Sinézio Rodrigues, Secretário de Meio Ambiente de Serra Talhada (PE), trataram das atribuições dos municípios no arranjo da responsabilidade compartilhada. 

Os gestores públicos ressaltaram a relevância do suporte técnico aos municípios parceiros de projetos de massa futura, os investimentos complementares para sistemas de coleta seletiva municipal e, ainda, as atribuições dos municípios para o alcance dos resultados pretendidos inicialmente.

Ambos mencionaram também a importância da regulamentação e fiscalização, da coleta seletiva, além do engajamento dos munícipes.

“Dentro da ideia de co-participação, me encanta e me agrada muito o modelo ofertado para São José do Rio Pardo para que a gente pudesse cumprir enquanto poder público municipal a nossa obrigação de promover coleta seletiva. Nós identificamos no nosso município um problema e tivemos a felicidade de encontrar rapidamente um caminho que nos foi ofertado por meio de um edital público que permitiu a São José do Rio Pardo ter a oportunidade de trabalhar pela constituição de uma cooperativa com toda a assistência técnica e direcionamento dado pelo Instituto Recicleiros, que tem um projeto sustentável e confiável”, elogiou Marcio. 

O prefeito continuou: “nós, gestores públicos municipais, não estamos preparados para fazer coleta seletiva, educar ambientalmente. Nós precisamos de apoio, amparo e caminho. Vocês têm dado a nós a oportunidade de trilhar esse caminho sustentável”.

“Essa co-participação exige responsabilidade financeira de todos nós, principalmente do poder público, que tem de assumir seu papel de relevância. Por que o município não pode destinar recurso do seu orçamento para garantir a promoção e efetivação desse tipo de política tão importante?”, questionou Marcio.

Sinezio Rodrigues foi na mesma direção e falou da experiência em Serra Talhada (PE), cidade que também conta hoje com o Programa Recicleiros Cidades.

“Precisamos enquanto poder público dar incentivos para que a gente consiga resultados mais imediatos. Em Serra Talhada, estamos enviando à Câmara dos Vereadores uma proposta de incentivo para o empresariado, por meio de desconto de alvará de funcionamento de estabelecimentos àqueles que façam a adesão à coleta seletiva, e para a população por meio da taxa de coleta do lixo. São formas que encontramos para agilizar a conscientização e adesão. E, claro, muita educação ambiental. Para isso, criamos uma parceria com universidades para estudantes fazerem a conscientização porta a porta falando da importância da coleta seletiva para preservação ambiental, geração de empregos e qualificar esses trabalhadores”, contou Sinezio. 

O secretário também abordou o tema da lei. “Precisamos avançar na aplicação da legislação. Quando aprovamos o plano de coleta seletiva, criamos regras e estabelecemos passos. Acredito que associada à comunicação, ao trabalho de educação ambiental e aos incentivos, precisamos atrelar a aplicação da lei”, apontou.

A voz das organizações de catadores

Por último, foi a vez de Claudia Pereira, Presidente da Recicla Serra Talhada (PE), e Celso Luiz Moulaz, Presidente da Coocamarji (RO), cooperativas incubadas pelo Programa Recicleiros Cidades, além de Roger Koeppl, Presidente da Cooperativa Yougreen (SP) participarem do debate. O trio discorreu a respeito do envolvimento e organizações de catadores na estruturação do projeto de Massa Futura.

“Temos valores muito comuns. Minha trajetória foi construindo uma cooperativa de catadores e também com profissionais de outras áreas para provar que era possível uma cooperativa prestar serviços para grandes geradores e empresas. Preenchemos esse espaço e deu super certo. Quando começamos a nos relacionar com Recicleiros, não existia do nosso lado um grande plano de negócios, mas sim uma grande vocação em querer resolver problemas. Não tínhamos experiência na área comercial, administrativa e como se relacionar com o mercado. Quando começamos a viabilizar esses projetos com Recicleiros, parece que tudo se encaixou. No primeiro projeto, viabilizamos um caminhão, esteira, duas prensas e mais alguns equipamentos para a cooperativa, e até hoje são os itens que dão estrutura a YouGreen. Ver o avanço de Recicleiros do nosso projeto-piloto até hoje é muito gratificante”, disse Roger Koeppl.

“A Massa Futura é muito importante para nós, tivemos um crescimento muito grande na região, que é muito distante dos grandes centros e temos dificuldade na comercialização e logística. Esse mecanismo possibilitou nosso crescimento, aprendemos muito. Ainda temos muito a fazer, mas depois de Recicleiros, as coisas mudaram muito. Quando chegaram, éramos pequenos, e hoje tomamos uma proporção muito grande, tanto que já temos duas filiais aqui em Rondônia, e pretendemos abrir outras”, contou Celso.

“Eu me apaixonei pelo projeto Recicleiros, que coloca a mão na massa, procura investimentos para implantar, incubar e dar dignidade às pessoas, que foi o que aconteceu em Serra Talhada. Temos educação ambiental, treinamento, capacitação, usamos equipamentos de proteção individual, existe um carinho e dedicação por parte do Instituto Recicleiros em relação a todos os cooperados”, falou Claudia. 

Na sua fala, Claudia também apontou um grande desafio: “é preciso conscientização das pessoas e mais atividade do poder público nessa questão. O que é cooperativismo? O que é material reciclável? As pessoas são carentes dessas informações”, encerrou.

Foram quase 3h30 de conversas e debates de alto nível, com personagens que fazem a reciclagem inclusiva acontecer. Para assistir na íntegra, acesse esse link aqui.

O que o aumento da reciclagem tem a ver com a estratégia de mitigação dos lixões?

A reciclagem tem um papel fundamental no desenvolvimento sustentável do planeta, já que preserva recursos naturais, diminui a quantidade de resíduos nos lixões e aterros sanitários, reduz a poluição do solo, água e ar, entre outros benefícios.

Além do aspecto ambiental, a coleta seletiva e reciclagem tem um papel social importante, uma vez que um grande número de catadoras e catadores ganham a vida com a renda obtida a partir da venda de resíduos sólidos recicláveis.

Leia também:

ZBRA desenvolve software exclusivo de gestão de dados para Recicleiros

Conheça os impactos ambientais, sociais e econômicos obtidos com o Programa Recicleiros Cidades

3 fatos que comprovam o caráter inovador da Academia Recicleiros do Gestor Público

O aumento da reciclagem pode ser visto como um indutor da mitigação de lixões. De acordo com a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), 39% do total de resíduos coletados em 2022, que corresponde a 29,7 milhões de toneladas, vão para a destinação inadequada, incluindo lixões.

Isso ocorre pois muitos municípios se deparam com a escassez de recursos financeiros para garantir a destinação final ambientalmente adequada para aterros, principalmente quando esses são distantes das cidades e o custo de transporte se torna um agravante para a inviabilidade. Aterros estão cada vez mais distantes das cidades e, portanto, cada vez mais caros para os municípios. 

Como o custo de destinação é uma relação entre volume e quantidade, quanto mais resíduos, mais caminhões, quanto mais caminhões, mais caro, a redução de quantidade de material tende a tornar a substituição de lixões por aterros mais factível. 

Para um município com alta eficiência na coleta seletiva de recicláveis, destinar os rejeitos para aterro é algo muito mais viável.

Dito isso, um ponto bastante relevante dentro desse contexto é a relação do aumento da reciclagem com a redução dos lixões. Afinal, quanto mais resíduos vão para a reciclagem e a cadeia produtiva da economia circular, menos itens têm os lixões como destino final.

Não existe a ideia de “jogar fora”

De certa forma, tudo que “jogamos fora” vai parar em algum lugar. Ou seja, na melhor das hipóteses, o lixo está indo para um aterro sanitário, o que ainda significa que está se acumulando de forma desenfreada no planeta. Por esse motivo, é bom ficarmos atentos, pois, na realidade, não existe esse conceito de “jogar fora”.

Quando não separamos os recicláveis do lixo comum, só estamos contribuindo para deixar nosso grande lar cada vez mais perto de se tornar inabitável. Mas, ao dar a destinação correta aos nossos resíduos, por meio da coleta seletiva e reciclagem, estamos contribuindo diretamente para uma cidade e um planeta mais limpo e sustentável, seja no aspecto social ou ambiental.

Por que os lixões devem ser combatidos?

Nunca é demais lembrar: o lixão é uma maneira inadequada de lidar com os resíduos, por isso devem ser extintos. 

Veja abaixo alguns motivos claros para o fim definitivo dos lixões nas cidades:

  • Poluição do solo e águas por conta do chorume acumulado.
  • Oferece riscos à saúde por conta do ambiente favorável à proliferação de doenças.
  • Recebimento de materiais perigosos, como os resíduos de serviços de saúde.
  • Gera grandes riscos a pessoas em situação de vulnerabilidade que buscam renda.
  • Geração de gases que podem provocar incêndios e potencializar mudanças climáticas. 

Para ampliar e aperfeiçoar os processos de coleta seletiva e reciclagem, a fim de vencer o desafio dos lixões, precisamos adotar novas medidas, como fomento à educação ambiental, bem como trabalhar a responsabilidade compartilhada dos diferentes agentes que fazem parte dessa cadeia sustentável.

Japão: exemplo inspirador de reciclagem

Um exemplo que pode inspirar a realidade brasileira e dar novos rumos à coleta seletiva e reciclagem é o Japão. Diante de uma área territorial restrita e grande população, lidar com a gestão dos resíduos é crucial para o país asiático. 

Houve, por anos, um investimento significativo em educação ambiental, além de busca por soluções que pudessem transformar a realidade local. Hoje, a gestão de resíduos no Japão está ancorada em três pilares principais.

O primeiro é a divisão clara de responsabilidades. Os consumidores, o setor privado, como indústria e comércio, e também o poder público tiveram seus papéis muito bem definidos. E não se trata apenas de direcionamento. Foi tudo bem estabelecido por lei. E cada parte responde pelo seu eventual descumprimento. E, aliado à lei, está a fiscalização.

O segundo pilar tem um aspecto econômico. O consumidor tem de pagar pelo descarte do lixo que produz, incluindo aqui o transporte e a reciclagem. Ou seja, quanto menos resíduos gerar, menor será a conta no final do mês. Aqui, entram também os famosos conceitos 3Rs – reduzir, reutilizar e reciclar.

Por fim, o terceiro ponto é a implementação gradual desse movimento em diferentes locais que, somados, acabam impactando o estado e, depois, o país inteiro. 

Em síntese, estamos falando em conscientização e educação ambiental, responsabilidade compartilhada, além da aplicação e fiscalização das leis.

Vamos trabalhar juntos pelo aumento da reciclagem? Estamos à disposição!

Remuneração justa de catadores como elemento de sustentabilidade da reciclagem

No texto de abertura deste blog, falamos sobre o conceito de reciclagem ética e sustentável, destacando o papel estratégico de cada ente dessa cadeia de valor na construção de  condições que atendam a estes dois conceitos. Isso serve como um bom pano de fundo para o assunto da vez: a remuneração justa e competitiva de catadoras e catadores do nosso país como um elemento vital para a sustentabilidade e o desenvolvimento contínuo dessa cadeia. Se ainda não leu o conteúdo anterior, acesse aqui!

 

Pois bem, o ecossistema da logística reversa de resíduos pós-consumo envolve diferentes entes e personagens: empresas, poder público, cidadãos, catadoras e catadores. Acreditamos que um modelo inclusivo e sustentável depende de um arranjo institucional que considera esses diversos entes estabelecendo deveres e responsabilidades claras e encadeadas para que a prática da economia circular possa acontecer de forma sistêmica e virtuosa.

 

Aqui, não há espaço para olhares direcionados a um ou outro player. Ao contrário, é fundamental a parceria entre todos, com cada um fazendo a sua parte, comprometidos com a qualidade e um objetivo comum: a redução do impacto ambiental dos resíduos associado ao desenvolvimento social da população mais vulnerável.

 

 

Há mais de 15 anos, o Instituto Recicleiros está comprometido com essa causa, e trabalha pela conexão e integração de todos esses atores. Atualmente, o Programa Recicleiros Cidades está operando em 12 municípios em 11 estados, por meio de contratos de cooperação técnica que visam o fortalecimento das bases regulatórias e institucionais da política de coleta seletiva inclusiva e o compromisso Recicleiros e de seus parceiros investidores em prover infraestrutura e capacidade operacional para o recebimento e preparação desses materiais para reciclagem. Tudo isso por meio da capacitação intensiva e transversal de pessoas provenientes de estratos sociais de alta vulnerabilidade.

 

Todo esse esforço vai ao encontro de padrões interessantes de qualidade, não só do material em si, mas do que está por trás disso, que são as condições que originam esse material. Garantias de que existem condições operativas que conversam com padrões de qualidade, com ergonomia, saúde e segurança no ambiente de trabalho e que a remuneração desses trabalhadores atende a padrões de dignidade necessários.

 

Equilíbrio para a roda da economia circular girar e não parar

 

A demanda pelos materiais produzidos nessas operações, nas unidades de processamento, é o mais relevante fator de sustentabilidade dessas operações. A depender dos valores e condições praticadas entre organizações de catadores e compradores de material, tem-se a prosperidade ou a inviabilidade desses empreendimentos. Olhar com essa visão crítica para as condições que esses contratos e ofertas representam, é olhar para a sustentabilidade dessa cadeia.

 

Uma oferta qualificada e condizente com a realidade do país, viabiliza o ganho de escala, produtividade e qualidade, pois permite a retenção dos trabalhadores e a melhoria contínua dos processos, com especialização de mão de obra e de fluxos produtivos.

 

Uma oferta qualificada vai além, permite a vida digna dos trabalhadores que compõem esse elo da cadeia, beneficia famílias, economias locais e propicia a longevidade dos empreendimentos de catadores.

 

Hoje, os valores médios de remuneração dos catadores mostram a fragilidade desses atores da reciclagem e proporcionam uma reflexão sobre qual a capacidade produtiva que de fato está sendo estabelecida no segmento.

 

De acordo com um levantamento realizado pela Associação Nacional de Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis (ANCAT) e pelo Instituto Pragma, com dados de 641 organizações de catadores, em 2020, foram 326,7 mil toneladas de materiais recicláveis comercializados, com produção média de 895 toneladas por dia. Tais números evidenciam a participação ativa desses integrantes na cadeia.

 

Por outro lado, quando analisamos a contrapartida que recebem, nota-se o quão desigual está hoje essa balança. Segundo o mesmo estudo da ANCAT, publicado em dezembro de 2021, a renda média mensal por catador vinculado a alguma das organizações consultadas é de R$ 1098. Ou seja, menor do que o salário mínimo, hoje fixado em R$ 1212.

 

Quando analisada por região, a região Sul lidera com renda média de R$ 1256 por catador; seguida pelo Sudeste, com R$ 1111 e Centro-Oeste: R$ 1091. As regiões Norte e Nordeste apresentam os menores salários, abaixo dos três dígitos, com R$ 975 e R$ 973, respectivamente.

 

Soma-se a isso a alta do preço dos alimentos. Por exemplo, entre janeiro a setembro, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) nos segmentos de alimentação e bebidas acumulam inflação de 9,54%. Para se ter uma ideia do que esse índice representa, trata-se da maior alta para os primeiros nove meses em 28 anos.

 

Valores tão baixos diminuem a atratividade dos postos de trabalho e incentivam o turnover, a rotatividade de pessoas nos postos, impactando diretamente na capacidade de qualificar pessoas e processos.

 

Como podemos viabilizar então esse elemento econômico tão importante para a sustentabilidade da cadeia?

 

Existem questões de estratégia de negócio que tendem a favorecer bastante a melhoria das ofertas pelos materiais recicláveis. Uma delas é a capacidade de encurtamento da cadeia, permitindo que os materiais processados pelos catadores cheguem diretamente aos recicladores, perpassando os intermediários e, com isso, capitalizando as vendas sem a dispersão de dinheiro com esses intermediários.

 

A questão não é super simples, mas tem um caminho. Negociações diretas com recicladores dependem de volumes que justifiquem fechamento de cargas em seu máximo aproveitamento e isso requer volume. Outro grande desafio é vencer a barreira do custo logístico para algumas regiões mais distantes dos pólos recicladores.

 

A solução passa (mas não se restringe) pela capacidade de se criar redes integradas de geração de recicláveis, que garantam padrão de qualidade e origem e possam integrar cargas ao longo dos trajetos logísticos, fazendo com que apesar do custo elevado de algumas regiões, menos expressivas em volume, sejam compensados por custos baixos de regiões com maior volume. 

 

No final da equação, essa composição tende a gerar um custo médio de frete viável. É exatamente o que estamos construindo aqui com o programa Recicleiros Cidades, mas queremos ir além das nossas próprias unidades de projeto. Queremos integrar iniciativas que garantam padrão de qualidade ao longo dos nossos trajetos logísticos e oferecer essas condições superiores de negociação com recicladores a um maior número de cooperativas no Brasil.

 

 

Disse antes que não se restringe a isso porque em alguns casos é necessário um rompimento com alguns conceitos impregnados na mentalidade do setor empresarial, o tal do conceito de viabilidade que muitas vezes é trazido à mesa de negociação junto a uma vontade de indexar preços com base em valores de commodities

 

Estamos falando de outra coisa aqui e não de uma escolha entre um material reciclável e uma resina virgem. Estamos falando do trabalho de recuperar resíduos do meio ambiente, da casa dos consumidores e efetivar a responsabilidade das empresas. Isso tem seu custo e deve ser analisado a partir dessa ótica.

 

Quanto maior for a eficiência das unidades de triagem - e aqui buscamos isso todos os dias -, melhor será a razão custo x benefício dessas operações. Só não podemos esperar que esses catadores e cooperativas tenham de buscar sozinhos meios para sobreviver, aquele famoso “se virem”. E, então, “se virem” para assegurar suas operações sem poder ter um sistema de combate a incêndio e/ou seguro patrimonial. Ou mesmo “se virem” para trabalhar sem parar, já que não podem pagar pela previdência ou ter pelo menos 30 dias de descanso remunerado a cada 12 trabalhados.

 

Sim, eventualmente empresas terão que assumir que o valor que chega aos catadores para uma tonelada de um determinado material não é o suficiente para o mínimo necessário para a sustentabilidade dessas operações, para a dignidade desses postos de trabalho. E aí, será fundamental sentar à mesa com os outros elos da cadeia, recicladores, convertedores e brand owners para construir uma oferta condizente, digna e sustentável.

 

Mas, e se for inviável?

 

Não existe inviabilidade quando consideramos compliance nessa equação. O que deve ser feito, tem que ser feito e de maneira ética, justa e inclusiva. Quando uma empresa diz que não pode pagar pelo custo justo e inerente de um processo que faz parte do ciclo de vida do seu produto e que não pode ser tratado como externalidade, está assumindo que o seu próprio negócio não é viável. Se não existe margem para que um determinado produto arque com seus custos inerentes, a resposta é clara: este produto não pode existir.

 

Sabemos que o retorno sustentável e digno de resíduos para a cadeia produtiva é viável. A questão aqui é sobre o compromisso do setor empresarial no cumprimento de suas obrigações. E, também, no empenho em criar alianças, articular parceiros e atuar com visão de médio e longo prazo na construção dessa cadeia, na busca conjunta pela eficiência de custos por meio do investimento estruturante qualificado, da tecnologia e da revisão de seus próprios projetos de embalagens e processos produtivos.

 

Nosso material vai além. Vai ao encontro do seu compromisso com a sustentabilidade e o impacto social para remuneração justa.

 

Queremos entregar nosso material reciclável aí na sua porta, diretamente da porta do seu consumidor, com rastreabilidade e um rastro de transformação social.

 

Mas, quais as vantagens para as empresas que firmam esse tipo de parceria com Recicleiros?

 

  • Oportunidade de criação de valor compartilhado e de inovação social, fomentando políticas públicas de coleta seletiva e reciclagem e participação direta de cooperativas;

 

  • Previsibilidade, pois garantem o fornecimento e os preços não são regulados por fatores externos como diferenças geopolíticas e oscilação do preço de commodities;

 

  • Fomentam a elevação da oferta de materiais pós-consumo, pois são provenientes de projetos de aumento dos índices de reciclagem (adicionalidade), o que representa mais estabilidade para o mercado a longo prazo, capacidade de cumprimento de acordos e pactos globais e a consequente elevação de benefícios sociais e ambientais. 

 

  • Reduz a emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE) e a entrada de resíduos sólidos em aterros e lixões;

 

  • Garante a segurança de abastecimento por meio de contratos firmes;

 

  • Reduz riscos para as marcas pelos atributos de garantia de origem ética e socialmente justa.

 

Estamos a todo o vapor construindo essa história. Se ela tem a ver com a filosofia da sua empresa, vamos conversar e somar esforços na construção do futuro da reciclagem sustentável no nosso país.

 

Te esperamos por aqui. Envie um e-mail para contato@recicleiros.org.br.