Nota de Esclarecimento sobre a situação da Recicla Garça

O Instituto Recicleiros tem acompanhado com atenção as recentes discussões envolvendo a paralisação da cooperativa de catadores Recicla Garça, cujas atividades estão suspensas desde 12 de março de 2025, em decorrência da falta de recursos e apoio por parte da administração municipal.

O Instituto Recicleiros reitera seu compromisso em colaborar com o município de Garça na construção de uma solução conjunta que viabilize a retomada das atividades da cooperativa Recicla Garça em condições de dignidade e segurança para seus trabalhadores. Reconhecemos que a situação atual dos catadores preocupa a administração municipal e acreditamos que, com diálogo e disposição mútua, é possível avançar para um modelo que atenda à legislação vigente, especialmente no que se refere à prioridade da inclusão de catadores na cadeia de reciclagem, conforme estabelece a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Entendemos também os desafios orçamentários enfrentados pelos municípios brasileiros, razão pela qual o modelo proposto pelo Instituto Recicleiros busca justamente otimizar os recursos públicos disponíveis, complementando-os com investimentos privados e garantindo, assim, que o serviço seja prestado de forma eficiente, segura, legal e socialmente justa. Ainda que o município tenha optado por um contrato emergencial com empresa privada para destinação dos materiais recicláveis coletados no município, reiteramos que a solução mais adequada é aquela que assegura o cumprimento da legislação e valoriza o trabalho dos catadores organizados em cooperativas, como é o caso da Recicla Garça.

Desde 2020, Garça integra o Programa Recicleiros Cidades, formalizado por meio de um Acordo de Cooperação assinado entre o Instituto Recicleiros e a Prefeitura Municipal. Por meio dessa parceria, o Instituto Recicleiros prestou apoio técnico à elaboração e institucionalização da política pública de coleta seletiva do município, colaborando diretamente na construção da Lei Municipal nº 5.491/2022, que institui a coleta seletiva em Garça.

Nesse contexto de cooperação, foram realizados investimentos diretos no município superiores a R$ 2,5 milhões, aplicados na reforma e adequação do galpão da cooperativa, na aquisição de máquinas e equipamentos de primeira qualidade, bem como na formação da Recicla Garça e no processo de incubação dos catadores. Esse processo envolveu treinamentos técnicos e administrativos, abrangendo áreas como operação de equipamentos, segurança do trabalho, gestão administrativa, cooperativismo, entre outros, assegurando as condições necessárias para o funcionamento da unidade

Essas ações resultaram não apenas na implantação de uma estrutura completa de coleta seletiva, mas também em benefícios diretos à sociedade garcense, que passou a contar com um sistema eficiente de gestão de resíduos, geração de emprego e renda, e valorização do trabalho digno dos catadores.

Todos esses investimentos foram realizados pelo Instituto Recicleiros com recursos próprios captados junto à iniciativa privada, fundos nacionais e internacionais. Esclarecemos que não houve, nem há, qualquer repasse financeiro da Prefeitura de Garça ao Instituto Recicleiros. Da mesma forma, a cooperativa Recicla Garça não realiza qualquer tipo de transferência de recursos ao Instituto. Todo o apoio oferecido é prestado de forma gratuita, tanto ao município quanto à cooperativa, com foco no fortalecimento da política pública de coleta seletiva e na promoção do trabalho digno dos catadores, que é o objetivo principal e foco do Instituto Recicleiros.

A coleta seletiva é um serviço público essencial, cuja titularidade é do município, conforme previsto na Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010) e no Marco Legal do Saneamento (Lei nº 14.026/2020). Cabe ao poder público assegurar condições para a sua execução de forma regular, segura e com dignidade.

Estudos técnicos e experiências práticas demonstram que a venda de materiais recicláveis é insuficiente para custear toda a operação com os padrões mínimos exigidos por lei, especialmente quando se busca garantir aos catadores uma remuneração justa (de pelo menos um salário mínimo mensal), EPIs, manutenção de equipamentos e condições adequadas de trabalho.

Por esse motivo, foi proposto à Prefeitura de Garça a remuneração pelos serviços ambientais prestados pela cooperativa, prática amplamente reconhecida por órgãos de controle e pela legislação vigente, e já adotada em diversas regiões do país. Essa remuneração seria destinada exclusivamente à Recicla Garça, permitindo o custeio de suas despesas operacionais e garantindo que os catadores possam exercer seu trabalho com dignidade, segurança e estabilidade, bem como garantindo estabilidade dos postos de trabalho e, assim, permitindo o desenvolvimento e melhoria contínua dos serviços prestados. O recurso público, portanto, permaneceria no município de Garça, sendo aplicado exatamente para o fim ao qual se destina: gerar benefícios concretos à população, por meio da inclusão social, da geração de renda e da destinação ambientalmente adequada dos resíduos sólidos urbanos.

Desde junho de 2024, o Instituto Recicleiros tem mantido diálogo aberto com a administração municipal, tendo apresentado ao todo, quatro propostas de plano de trabalho com o objetivo de garantir a continuidade das atividades da Recicla Garça. Nenhuma, porém, foi aceita ou cumprida, nem tampouco formalmente respondida. A única contraproposta considerada pela atual gestão foi a operação da cooperativa com base exclusiva na venda dos materiais recicláveis, proposta já amplamente reconhecida como insustentável.
Diversos estudos técnicos, bem como o entendimento do Ministério Público, apontam que a comercialização dos recicláveis não é suficiente para garantir a dignidade e a sustentabilidade da operação. Como afirmou o Dr. Luciano Loubet, mestre e doutor em Direito Ambiental, promotor de Justiça do Ministério Público do Mato Grosso do Sul (MPMS) e presidente da Associação Brasileira de Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (ABRAMPA), é imprescindível o pagamento pelos serviços ambientais prestados pelas cooperativas de reciclagem. Atualmente, não há no Brasil qualquer experiência bem-sucedida de coleta seletiva sustentada apenas pela venda dos materiais que não comprometa a ética, os direitos humanos e a dignidade dos trabalhadores.

Com 18 anos de existência, o Instituto Recicleiros se consolidou como uma organização séria, transparente e comprometida com a promoção da sustentabilidade ambiental e da inclusão social de pessoas em situação de vulnerabilidade. Ao longo de sua trajetória, estabeleceu parcerias com governos nas esferas federal, estadual e municipal, bem como com grandes empresas e organizações nacionais e internacionais, consolidando um modelo de atuação que alia responsabilidade socioambiental, eficiência técnica e impacto social positivo.

Cabe ainda ressaltar, que durante todo o período em que contou com apoio integral do Instituto, todos os cooperados da Recicla Garça receberam ao menos um salário mínimo mensal, salvo eventuais situações previstas no regimento interno da cooperativa, como faltas sem justificativa. Atualmente, com a paralisação das atividades, os catadores estão sem qualquer fonte de renda, o que compromete diretamente a subsistência de dezenas de famílias em situação de vulnerabilidade no município de Garça.

O Instituto Recicleiros segue absolutamente comprometido com a busca de uma solução que viabilize a retomada dos serviços da Recicla Garça e a sustentabilidade da cooperativa. Reiteramos nossa disposição para o diálogo com os gestores municipais, vereadores, parceiros e toda a sociedade, com transparência e base técnica, visando garantir um serviço público eficiente, justo e digno para todos os envolvidos.

Instituto Recicleiros

30 de maio de 2025

Para saber mais sobre as propostas enviadas à prefeitura de Garça clique aqui.